segunda-feira, 25 de agosto de 2014

A direita no divã

Fonte da imagem: mundobla.com.br


Não gosto de falar em direita e esquerda, porque se trata de uma simplificação dos diversos matizes políticos e econômicos que existem. Entretanto, ousarei fazer tal reducionismo, a fim de facilitar a compreensão do que se pretende dizer daqui em diante.

O problema da direita no Brasil é que não existe um cara sério que a represente. São apenas caricaturas, um bando de ignorantes primitivos. Torna-se fácil, assim, para a esquerda dominar o discurso político, surrar constantemente os adversários nas eleições, realizar conchavos a seu bel-prazer, infiltrar-se no seio cultural e acadêmico como única via ideológica possível. Chega de Bolsonaros e Felicianos! Essa gente é demente! Eles destroem a imagem da direita!

É possível falar em incentivo ao mercado livre, menos amarras estatais e ser liberal politicamente (sentido americano da palavra liberal). Também é possível ser conservador, com um discurso razoável, que defenda valores consagrados pela tradição sem um determinismo histórico, que esteja atento às mudanças sociais e culturais pelas quais passamos. Particularmente, alinho-me um pouco mais com essa segunda opção: liberal economicamente (sentido inglês) e conservador soft politicamente. Por que é tão difícil surgir alguém assim no Brasil? A coisa mais à direita que possui algum potencial de oposição efetiva é centro-esquerda, qual seja o PSDB. Não é só no nome: trata-se de um partido com programas fortemente sociais, que estabeleceu as agências reguladoras no mercado (isso é antiliberal na veia), que enxerga no estado forte uma necessidade econômica. A alcunha neoliberal ao PSDB é uma falácia! Trata-se de uma construção dos partidos outrora radicais de esquerda, a fim de posicionamento, de demarcação política. Afinal de contas, o pensamento marxista assim se estabelece: mediante a divisão das classes, do "eles" e "nós". Para sua consolidação, é necessária a ruptura social. Logo, é preciso haver a demonização da entidade que se apresente como detentora de poder. Sobrou para o PSDB, que se estabeleceu em importância a partir de 94, com a vitória de FHC. Portanto, o PSDB não é essa direita que cumpriria os pleitos de uma camada expressiva da população de uma forma mais bem articulada.

Retomo a pergunta: por que não surge alguém assim?

Começo pelo prisma individual. Observo que as pessoas que assim pensam não têm o discurso inflamado, sendo menos propensas a se reunir em prol de causas comuns. É evidente: isso, de certa forma, contraria sua natureza, pois o norte filosófico é o individualismo. Bem comum e programa ideológico são expressões malvistas por tais pessoas. Logo, diminuem-se as chances de haver reunião política, tampouco a formação de agremiações ou partidos. Em geral, são cidadãos que têm os seus empregos, que são ligados em política, mas que de modo algum sairiam às ruas para lutar por demandas políticas que lhes são próprias. Em junho de 2013, eles estavam assistindo à patuscada toda dos sofás de suas casas ou buzinando contra os manifestantes dentro de seus carros parados por mais de 3 horas.

Sob o prisma ambiental ou coletivo, é de se notar que o caldo cultural brasileiro demoniza o liberalismo econômico e o conservadorismo político. Confundem-se os seus pilares com os do tempo da ditadura militar. A formação intelectual brasileira, no plano político, foi forjada durante esse período, remanescendo até os dias atuais. O antiamericanismo surge daí, visto que os EUA incentivaram as ditaduras na América do Sul. Claro que o fato de haver uma guerra fria com a URSS nesse período, enquanto inflamavam-se as causas socialistas por esta região, é esquecido. O que sobrou disso tudo é um ódio aos americanos, ao seu imperialismo, ao seu sucesso econômico, sem a correspondência histórica às ações deste país. Portanto, para ser descolado por aqui é necessário se portar à esquerda.

Convenhamos, parece bonitinho ser de esquerda. Na superfície, são pessoas que defendem a igualdade, o respeito às minorias, o cuidado ambiental, o laicismo, a valorização da cultura suburbana, a função social da propriedade, entre vários outros pleitos. Como discordar de pessoas que defendem tais valores? O problema da esquerda reside sempre no modo. O que fazer para chegar a esses objetivos? Aí é que começa todo o problema... A demonização da direita passa por isso: defende-se que a direita é contra a igualdade, contra as minorias, contra o meio-ambiente, contra o laicismo, contra a contracultura etc. E aí chega um Bolsonaro da vida e confirma a tese esquerdista; por isso o seu desserviço. À verdadeira direita, aquela dotada de inteligência, cabe demonstrar que não! Ninguém em sã consciência pode ser contrário a isso! O que se deve combater são os meios que a esquerda propaga, bem como oferecer soluções para se atingi-los, sem devassar outros princípios também importantes, como a liberdade de produção, a isonomia na relação Estado-indivíduo, desenvolvimento econômico, liberdade religiosa, valorização da cultura tradicional, a defesa da propriedade individual etc.

Porém, quem se animaria a fazer isso? Prefiro reclamar em reuniões de bar, afirmar minha antipatia com a politicagem brasileira, fazer o meu trabalho e viver minha pacata vida. E assim seguimos dominados...

2 comentários:

  1. Supondo que o texto tenha um autor, ele refuta a si mesmo. Há pessoas razoavelmente sérias que representam a direita (como o autor o qual, inclusive, diferente do que alega, expõe-se publicamente com tal texto). Embora sério, o autor equivoca-se sobre até mesmo o que fazem os representantes mais notórios, que não são contra a parte relativamente consensual de certas bandeiras da esquerda, mas precisamente ao uso de tais bandeiras como engodo. O problema de tais representantes notórios da direita é precisamente o modo como apresentam algumas objeções legítimas. Não compartilho com Bolsonaro de seu estatismo e autoritarismo, mas admiro atos de falsa truculência, como seu enfrentamento de Maria do Rosário a lhe tentar chamar de estuprador.

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  2. Olá, Régis! Obrigado pelo oportuno comentário e pela saudável divergência. Mesmo que eu tenha me exposto publicamente com este texto, não me vejo como representante da direita. Gostaria de sê-lo, mas não sou afiliado a partidos, não sou um intelectual de renome (e com razão, pois me falta muito feijão com arroz para aspirar a isso), nunca fui liderança de alguma coisa (renunciei à liderança de classe no segundo dia de mandato na 4ª série do fundamental). Quando falo em representação, refiro-me a algo neste porte. Somos pobres nisso...Temos alguns bons articulistas, tais como J. R. Guzzo, mas não há nada próximo disso na política. Quanto ao Bolsonaro, sua veia autoritária, que se observa inclusive no MODO como apresenta suas objeções (muitas delas legítimas, sim), não condiz com os objetivos liberais, por isso o seu desserviço. Evidentemente, a parcela hipócrita da esquerda se utiliza desse expediente para atacá-lo como se ele representasse o protótipo da direita, bem como extrapolam em seus argumentos de combate, imputando-o desvio de caráter até onde não tem. A questão é: Bolsonaro e toda essa trupe dá vazão ao jogo sujo da esquerda. Esse tipo de gente é que permite a vitória sistemática das esquerdas no Brasil e em boa parte da América Latina. Ou encontramos representantes sérios (de novo: representante de expressão e com vigor político) ou naufragaremos...

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