quarta-feira, 10 de outubro de 2012

A função social do palavrão




O palavrão, além de designar palavras extensas, é conceituado como uma expressão de baixo calão, geralmente com tom ofensivo. Por tal natureza, é costumeiramente repreendido o seu uso, sendo o sujeito educado, desde infante, a não o proferir em público. Porém, por mais deselegante que possa parecer a sua utilização, é inegável que o palavrão cumpre uma fundamental função social!

Ora, e qual seria a função social do palavrão? Simplesmente todas ligadas à manutenção da sanidade mental, o que implica em uma propensão à sadia relação do ego com o meio social.
Imaginemos uma cena corriqueira, tal como um quase acidente entre carros. Passado o susto, é comum verificar que ambos esbravejam e soltam o vasto repertório de palavras ofensivas, independente da culpa de um ou outro para aquele ato. Até o arrefecimento dos ânimos, segue-se o palavreado. E se o sujeito não soltasse essa raiva mediante as palavras, o que poderia ele fazer? Das duas, uma: ou ele chegaria às vias de fato em todas as oportunidades, ou ele seguraria isso consigo, até que não fosse mais possível manter-se são. Como poderia alguém tocar a sua vida, se todas as raivas fossem acumuladas? Daria pane no sistema, sem dúvida.

Além disso, o palavrão tem o condão de aproximar as classes sociais. Todos são idênticos, ao soltarem tais verbetes! Não há distinção de vocabulário, aí! Todos reconhecem um filho da puta, não? Agora, quantos reconhecerão um sacripanta? Imaginem uma cena na qual alguém te passa a perna. O que tu dirias? “Mas que sacripanta”? Ou, “mas que filho da puta”? A última, com certeza, condiz mais com o grau de sua indignação perante a trapaça da qual foi vítima. Não à toa que todos a utilizam, em detrimento do pudor.

Um cenário perfeito e que realiza essa função social com louvor é o estádio de futebol! Em que pese alguns arruaceiros que fazem de tudo para estragar o espetáculo, o estádio é frequentado pelas ditas “pessoas de bem”. Não gosto de maniqueísmo, mas vamos aceitar como “pessoas de bem” aquelas que se mantêm dentro dos limites aceitáveis de convivência social, que não transgridem seriamente as regras da esfera criminal e civil. Pois bem. Quase todas as pessoas desse espectro (não vou dizer todas, pois sempre há alguém demasiado purista – geralmente é um chato de galocha, mas deixa pra lá) soltam os mais variados palavrões, seja em direção ao árbitro, adversário, técnico ou a algum jogador ruim do próprio time. É como se fosse uma bolha social em que se permite tal comportamento, a fim de que as pessoas retornem ao cotidiano mais leves. O futebol é uma ferramenta completa de controle social, e muito devido a isso.

Outra característica do palavrão é quanto ao fato dele ser aceito em piadas e nos atos sexuais. Como é fácil perceber, tratam-se de ambientes transgressores, no bom sentido. A piada só é engraçada quanto transgride o bom senso, e o sexo é melhor na medida em que é mais proibitivo e privado. E o palavrão surge como um instrumento eficaz para a satisfação de ambos nichos. Assim como nem toda piada tem palavrão, nem todo sexo conta com palavras picantes e proibidas. Mas quando damos mais risada? E quando nos excitamos mais? Para bom entendedor, poucas palavras bastam...

Desta forma, sugiro uma reflexão: que tal darmos mais valor ao palavrão? Em vez de nos fiscalizarmos, como se fôssemos patrulheiros da moralidade, por que não nos soltarmos e permitirmos a sua utilização com tranquilidade? Palavrão é tudo de bom! Palavrão salva vidas! Salve o palavrão!