A Criação de Adão (afresco da Capela Sistina, Vaticano) - Michelângelo Buonarroti |
Michelângelo
Buonarroti levou 4 anos para finalizar o teto da Capela Sistina. É
possível que esta seja a grande realização artística da
humanidade. Logo, é de se imaginar o esforço e a concentração de
energia do artista para a produção de uma arte de imensa magnitude.
A questão é: você, homem moderno, seria capaz de direcionar toda
sua força, e por tanto tempo, a uma obra, seja ela qual for?
Não raras vezes
perguntamo-nos por que a civilização contemporânea, em que pese o
aparato tecnológico disponível, é tão pobre artisticamente, em
comparação aos períodos históricos passados. Não há hoje um
único gênio da grandeza de um Leonardo da Vinci, Shakespeare,
Rembrandt, Chopin, Rodin, Dante Alighieri, Beethoven etc. Ao menos,
não o há em relevância produtiva (pode haver, sim, um potencial
artístico inexplorado). Uma das razões apontadas é justamente
quanto ao fato destes gênios anteriores terem praticamente esgotado
as formas de representação cujo encantamento pela beleza é
despertado a um nível extremado por meio dos nossos sentidos. Ou
seja: mesmo havendo um gênio hoje, ele estaria sufocado
criativamente, porquanto impossibilitado a despertar sensações de
comparativa relevância por meios originais, somente pelo fato de não
haver mais novos paradigmas a ser construídos que equivalham em
beleza às construções anteriores. Não descartando essa hipótese,
acredito em outra razão para tal fenômeno: as facilidades
tecnológicas tiram a atenção que um artista deve direcionar a uma
obra, a fim de que ela seja grandiosa.
O mundo atual é
fascinante pela capacidade de informação cada vez mais crescente de
que dispomos com uma facilidade de acesso impressionante. São
necessários alguns cliques em um computador para nos informarmos a
respeito de quaisquer fenômenos que a humanidade conhece. E essa é
a forma ativa de processamento de informação! Passivamente, somos
bombardeados de novas informações somente ao ligarmos aparelhos
tais como a televisão e rádio. Voltando à computação, podemos
simplesmente armazenar informações em um HD, seja interno ou
externo, prescindindo do cérebro para tal função. Isso é
realmente incrível, mas é devido também a tal circunstância que o
homem moderno é simplesmente incapaz de produzir obras de extrema
profundidade. Em um primeiro plano, porque se distrai facilmente com
as mais variadas informações, perdendo grande parte do seu tempo
que poderia ser direcionada à feitura de uma produção artística.
Em um segundo plano, porque a possibilidade de ter um verdadeiro
extensor cerebral o torna destreinado para armazenar aquilo que
interessa, por mais paradoxal que isso possa parecer. O que deveria
facilitar é a causa para a inaptidão à grandiosidade! O desuso do
cérebro o atrofia e faz com que se torne preguiçoso, quando instado
a produzir em um nível de extrema complexidade. É necessário um
denodo de Michelângelo para construir uma obra-prima! É realmente
comovente imaginar como deve ter sido a vida deste homem durante os 4
anos em que pensou, comeu, trabalhou e dormiu a arte que estava
construindo. Será que ele a faria, se tivesse de responder um e-mail, acessar o Facebook, perder-se no Google, informar-se no Wikipedia, assistir a uma série de TV para relaxar? Uma pessoa moderna, com esta gama de possibilidades que
a tecnologia o traz, simplesmente não consegue se dedicar desta
forma a uma realização qualquer. Estamos aqui tratando de arte, mas
poderíamos tranquilamente estender a outras atividades humanas, tais
como o pensamento científico e filosófico. O último grande gênio
fora Einstein, e em sua época, início do século XX, não havia
essa profusão de informações que temos hoje.
Não podemos desmerecer
as obras atuais, mas é notório que há um abismo qualitativo nesta
ingrata comparação com o passado. Ingrata, sim, pois somos mais
críticos em relação ao período em que vivemos – faço agora um
mea culpa. Tampouco podemos dizer que nenhum homem moderno é capaz
de escapar a essa regra. Sempre há exceções! É possível, sim,
que haja alguém talentoso e obstinado o suficiente para concentrar
toda sua energia em prol de uma grande produção. De qualquer forma,
não acredito que uma obra atual, feita sem essa obstinação de um
Buonarroti, sobreviva ao tempo assim como as clássicas chegam até
nós intactas. Não há nada como o passar do tempo, para a medição
de qualidade de uma obra de arte. Terá a modernidade produzido algo
grandioso, a não ser as próprias tecnologias, que parecem impedir o
desenvolvimento de outras realizações profundamente? Será que a
era de Steve Jobs não comporta um Michelângelo, para lhe dar
beleza? Só o futuro dirá!
O grande problema dos atuais candidatos a gênio se chama pretensão. Hoje qualquer mequetrefe que rabisca coisas ininteligíveis ou faz barulhos guturais se diz gênio e, pior, grande parte dos formadores de opinião batem palmas e adulam, no afã de lucrar em cima do fanfarrão. /uma característica importante dos verdadeiros gênios, alem da humildade, é o foco exclusivo no seu trabalho; até porque os pintores do tempo de michelangelo e da vinci eram vistos como meros trabalhadores da construção civil e não tinham status maior do que o dos demais profissionais que operavam nas obras. Não procuravam obcecadamente o aplauso das multidões, mas sim a excelência técnica de seu trabalho, tendo em vista tão somente a satisfação que quem os contratou
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