terça-feira, 2 de junho de 2015

Pelos ares

O gol mil (Fonte: www.vamovamointer.com)


Nos idos de 2004, discuti com um colega do 3º ano de ensino médio a respeito de um gol em um grenal. Ele, gremista, e todos sabem como são os gremistas; eu, um colorado inveterado, fanático, mas jamais doente, porque vocês sabem que colorados nunca o são. O gol havia sido feito por um colorado. Ganhamos aquele jogo por 2x0, para variar. Ele, o gremista, defendia que aquele gol estava desqualificado, pois não fora realizado por um ídolo, mas por um reles forasteiro que recém chegava por essas bandas. Eu, firmemente, resistia àquele argumento, defendendo a predestinação daquele sujeito, que em sua primeira partida anotava o tento em um grenal. Nada pode ser mais grandioso do que um gol em grenal, em estreia, repetia eu, convencido! 

No fundo, eu concordava com o gremista - afinal de contas, eles são bons argumentadores, tal como o Satanás. Poxa, o gol mil foi marcado por um forasteiro, pensava eu, em contraposição à minha apaixonada exposição. Estávamos, no entanto, redondamente enganados! Se havia um jogador, dentre aqueles que disputavam o jogo, que deveria fazer o gol mil, nada mais justo que fosse ele próprio o autor. O registro civil brasileiro denomina o ilustre futebolista como Fernando Lúcio da Costa. O universo colorado, no entanto, reverencia-o por sua imponente alcunha: Fernandão.

Tal como um ser mitológico, Fernandão chegou pelos ares, alvejando o rival com um míssil certeiro. Como se diz na minha terra, chegou chegando! Nos primeiros toques, notava-se algo diferente em campo. Tínhamos, agora, classe e inteligência. Multifuncional, movia-se pelo campo com soberba, seja como meia-cancha, seja como centroavante. Aos poucos, tivemos também uma liderança. O clube adquiriu, com sua chegada, uma força que até então eu nunca tinha presenciado, visto que pertenço à terrível geração dos anos 90. Gamarra era meu maior ídolo, até aquele momento. Um estupendo jogador, o melhor zagueiro que vi na vida, mas que conquistou apenas um gauchão. Pouco para um ídolo de um clube da grandeza do Inter. Os colorados dos anos 90 precisavam de um Falcão para chamar de seu. Eis que agora o tínhamos!

Se Fernandão fosse um personagem bíblico, certamente seria Moisés, porquanto nós - colorados que não viram os anos 40, 50 e 70 - fomos libertados, escravos que éramos da inaptidão para conquistas. Se Fernandão fosse um personagem político, sem dúvida seria Robespierre, pois trouxe a revolução decepando a cabeça de seus adversários, implacável que era. Se Fernandão fosse cientista, com certeza seria Charles Darwin, visto que trouxe à tona um novo roteiro para a origem das coisas, desabando com o mundinho fantasioso a que os rivais estavam acostumados. Quis o destino que Fernandão fosse maior do que tudo isso: o maior ídolo da história do Sport Club Internacional!

Dia 07 de junho fará um ano de sua morte precoce. A homenagem se faz obrigatória, pois ídolos dessa estirpe se eternizam em nossos corações.

E vejam só: tal como ele se nos apresentou, foi pelos ares que se nos despediu. Justo, pois assim são os seres mitológicos...

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